Entrevista: Rodrigo Melo apresenta Riviera, seu primeiro romance
Palavras-chaves: editora Mondrongo, Literatura, livro Riviera, Rodrigo Melo
Lançado neste ano, Riviera pode ser adquirido no site da editora Mondrongo ou em contato com o autor (Facebook: Rodrigo Melo; WhatsApp: 73 9 8818-3865).
O escritor Rodrigo Melo conversou com o Ilhéus Comércio sobre o seu primeiro romance, Riviera, lançado pela editora Mondrongo neste ano. O protagonista da história é Michel Rodrigues, que deixa sua cidade no sul da Bahia para se aventurar em busca de uma mulher no Rio de Janeiro.
A busca começa na Copacabana onírica de um jovem sonhador e avança cidade adentro. O narrador onisciente nos conduz pelos sentidos de Michel. Na cena de um beijo, por exemplo, dá pra sentir o gosto de cream cracker na boca de uma personagem.
Não só de sinestesia vive o homem – nem mesmo na Cidade Maravilhosa. Não demora para a realidade atentar contra os sonhos de Michel, mas ele já se jogou na aventura e tudo vai dar certo em algum momento – diz seu otimismo de beatnik praieiro.
Autor de livros de contos – Jogando dardos sem mirar no alvo e O sangue que corre nas veias – e de poesia (Enquanto o mundo dorme – todos editados pela Mondrongo), Rodrigo Melo apresenta seu primeiro romance na entrevista abaixo. O escritor fala das idas e vindas do processo criativo, enfatiza a contribuição que recebeu nesse caminho e revela as semelhanças da história com sua experiência no Rio de Janeiro. Leia.
A história caminha pela autoficção?
Tem muita coisa. Tudo parte da realidade, de uma vivência. Depois que a gente começa a escrever, a história puxa para os lados, surgem personagens e situações. Acho interessante escrever sobre algo vivido. Assim a gente pode falar aquilo com mais verossimilhança e propriedade. Trabalhei como corretor no Rio, numa imobiliária. Tive um chefe parecido com Aldo Lomma. Morei na Zona Sul e na Zona Norte. Trabalhei também numa empresa de Muncks. Já me vi uma vez na night saindo da empresa de Muncks e ir correndo desesperado até chegar na estação de Ramos – um medo monstro! Tem coisa que realmente tem uma base, mas, na história em si, os acontecimentos são inventados.
Você preferiu não usar o nome de Ilhéus. A cidade do protagonista não é nomeada. Michel Rodrigues é um tipo de qualquer cidade do sul da Bahia?
Não foi só Ilhéus. Tem um camarada, conhecido nosso, que leu o livro. Ele me falou sobre uma parte da oficina. Ele disse: “Pô, mas o caminhão a diesel não tem carburador”. Aí falei pra ele: “Porra, nem me liguei”. Ele perguntou: “Você tava lá nessa oficina?”. “Tava, todo esse tempo”. Expliquei as duas razões: primeiro, porque eu fui um péssimo ajudante de mecânico. Segundo, esse tipo de detalhe é indiferente pra mim, se o cara é de Ilhéus ou de Canavieiras, porque ele não é um jeca, mas também não é aquele cara totalmente veloz. Está no meio do caminho. Eu viajei muito na coisa da história, em ter ritmo, fazer sentido. Eu não fui fidedigno a ruas ou paisagens, porque, no fundo, o que importava era o que estava acontecendo. Eu cortei quarenta páginas do livro para dar agilidade [à narrativa], por conta da ação.
Você usa muito a descrição de movimentos e imagens para compor as cenas. Esse exercício é custoso?
Cada momento tem uma pegada. Tem hora que vai ser uma merda escrever e outra que flui sensacional. Vou ser sincero contigo: adoro escrever. Respondendo questionários, muitas pessoas dizem que não vivem sem escrever. Não sei se eu precisaria escrever. Escrevo porque as situações vieram até mim. Não sei: às vezes é difícil, às vezes é gostoso. Revisei esse livro pra caralho. Contei com a ajuda de vários camaradas. Escrevem muito, gosto muito deles. São meus amigos Paulo Bono e Marcus Borgón. Paulo Bono lançou recentemente Sexy Ungly – sensacional ! Esses caras leram Riviera duas vezes. Fabrício Brandão, da [revista digital] Diversos Afins, também leu. Consultava também minha esposa, Talita, sempre lendo. Em primeira mão, sempre ela. Precisei da opinião de um leitor comum e procurei Chico Correia. Gosto da energia dele, é muito boa, ele tá aberto para as coisas. Jogue, que ele vai mastigar e dizer o que é. Joguei o livro pra ele. Contei com essa galera. Nesse momento foi massa escrever. Mas, quando estava começando, era muito difícil. Fiquei anos sem pegar no livro. Depois voltei, porque precisava terminar. Foram várias etapas. Ele chegou a ser narrado em primeira pessoa. Mudei inteiro. Ele era panfletário em algumas coisas. Dei uma aliviada. Fui revisando e cheguei no que era essencial mesmo.
Muitas vezes, Michel dá a impressão de ser muito ingênuo, sonhador, maravilhado com a parte bonita da cidade.
Total. Uma vez eu contei sobre a história do livro para um grande amigo, Tom Correia. Ele disse: “Porra, Rodrigão, esse cara não existe. É muito ingênuo. O cara larga tudo e vai atrás”. Eu respondi pra ele: “Existe, esse cara sou eu”. Muita gente faz aquilo ali. Tem muito Michel Rodrigues por aí.
Isso aproxima Michel daquela beatitude da geração beat?
Eu acho que esse livro aí tem os caras que eu gosto. Cinco ou seis caras que eu mais li. Tem muita coisa de Rubem Braga, Kurt Vonnegut e da literatura beat. Aquela coisa solta, o existencialismo meio mambembe. E tem muito John Fante. Tem muito Rubem Braga, Bukowski. Vejo muito isso: aquele cara flaneur. Os caras estavam como uma esponja. Michel Rodrigues é um personagem que está ali para absorver mesmo, ver o que o mundo tem para dar.
Em alguns momentos, a história nos leva pelo inconsciente onírico, e o personagem também sonha muito acordado. O mundo é um moinho de sonhos para Michel?
Ele é um cara que acredita nas coisas. Acredita no sonho. É um sonhador mesmo. É difícil explicar isso. É aquele cara que acha que lá na frente tudo vai acontecer. E essas coisas podem acontecer realmente.
Ele tem uma máxima recorrente sobre isso.
Tem uma cena no hotel que ele faz isso. Logo quando chega, ele abre os braços e se joga sobre a cama, como se saltasse de um altíssimo trampolim. Aquilo pode ser uma metáfora para a história toda, para a vida: fechar os olhos e se jogar. Ou simplesmente tentar. Seguir em frente. Existe uma hora que a gente tem que escolher ficar ou sair correndo. Ele saiu.
3 Comments
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Rúbio Rocha
9 de julho de 2020 at 20:24Gostei muito da entrevista. Parabéns ao entrevistador e ao escritor entrevistado. Li o romance e gostei muito. Trata-se de uma narrativa muito bem planejada, tudo é muito bem medido, os acontecimentos estão muito interligados, há um jogo muito interessante entre os fatos. Além da metáfora mencionada em sua última fala nesta entrevista, há várias outras também bem interessantes. Rodrigo Melo começou com o pé direito na seara dos romances.
Pawlo Cidade
10 de julho de 2020 at 13:43Gostei de Riviera. Mas vejo muito de Juan Rulfo nele quando a questão é objetividade. Não devia ter eliminado as 40 páginas. Mas faz parte. Afinal, como dizia Jorge Amado, “as verdadeiras histórias nascem de experiências vividas pelo próprio autor”. Riviera é isso. É, como disse um crítico sobre a obra de Juan Rulfo: “familiar a tudo”. Viva, Riviera! (Pawlo Cidade, escritor).
Em busca de um morango mofado: a saga de Michel Rodrigues no Rio de Janeiro | Ilhéus Comércio
10 de julho de 2020 at 20:48[…] ano de 2020, o ótimo contista ilheense Rodrigo Melo publicou o seu primeiro romance: “Riviera”. Como em seus contos, nessa maior narrativa, o agora também romancista atou com muita agudeza e […]